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Luzia Lage – Majestosa Imperfeição
24 Setembro, 2022 - 30 Outubro, 2022
PELO SONHO É QUE VAMOS
Rui Patrício
Tomo de empréstimo o título do poema de Sebastião da Gama para salientar que, se tivesse que escolher uma só palavra para ilustrar a obra de Luzia Lage, escolheria sonho. Outros nela verão coisas diferentes, e ainda bem, pois a arte que verdadeiramente o é carrega e oferece incontáveis sentidos – e sentimentos. Não é de agora que conheço e admiro a obra da artista, nem comecei só agora a gostar muito dessa obra (e a arte tem também que ser gostosa, mesmo que se não vá ao ponto de acompanhar a poeta sobre ser a poesia para comer), e não é só hoje e aqui que me ocorre – entre outras coisas, mas sempre acima delas – sonho. “Majestosa Imperfeição” é mais um passo, o mais recente, no caminho do conhecimento, da admiração, do gosto e, claro, do sonho. Sonho não num, nem em dois, mas pelo menos em três sentidos. Pois se tudo é polissémico e poliédrico, mais a mais a arte.
Naturalmente, logo no sentido mais habitual, talvez o sentido mais ao pé-da-letra, o de experiência (da imaginação? do inconsciente? de quê?) durante o período de sono. O que aí vemos, ouvimos, sentimos; o que aí vivemos, com júbilo ou medo, em jeito de deformações embora tantas vezes muito reais. Entreguemos o olhar aos quadros de Luzia Lage e aí tanto disso podemos encontrar. Mas também sonho no sentido de memória, de recordação, de narrativa. Revisitar e reviver a vida, as emoções, as experiências e, por sobre tudo, as pessoas, as nossas pessoas, os nossos afetos, tudo encarnado nas personagens que habitam os quadros da artista. Sonho de reviver a vida, com mais ou menos melancolia, mas sempre em cores fortes e aconchegantes. Sonho do que já foi, mas permanece em mim, em nós. O primeiro sentido seria o de sonho-dormido, o segundo de sonho-vígil. Finalmente, no sentido de esperança, de sede de futuro, e de caminho – fome de ir, de alcançar, de chegar mais além. Sonho-vigilante. Fome de melhor vida e de melhores pessoas – consigo mesmas, com os outros, e com todos os seres. Sonho como desejo e como esperança de superação. Afinal como culto do rio heraclitiano, que sempre muda e se renova, esperando a obra desta artista – se bem compreendo – que para melhor, embora sem perder de vista (e como!) a imperfeição. Porque imperfeita é a vida, imperfeitos somos, e porque a imperfeição impele a olhar em diante, faz viver e querer viver mais e melhor, desafia(-nos).